Como o Movimento Wikimedia marcou presença na composição de recomendações de governança da internet para as nações do G20
A defesa da internet livre, democrática e plural, que proteja projetos de interesse público e os bens públicos digitais, foi promovida no G20 Social, graças à mesa “Reforma da governança global: o Pacto Digital Global no contexto da Internet Livre”. Organizada pelo Wiki Movimento Brasil, a atividade contou com parceria da Agência Lupa, do Idec (Instituto de Defesa do Consumidor) e do data_labe. No segundo dia da Cúpula, o Wiki Movimento Brasil também esteve ativamente engajado na Plenária de Participação Social, que resultou em recomendações concretas para a declaração final, entregue às lideranças do G20.
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A mesa de debate foi uma das 250 atividades autogestionadas (inicialmente eram 270, mas algumas foram unificadas por possuírem temas correlatos) que, segundo os organizadores, reuniram quase 20 mil pessoas credenciadas entre os dias 14 e 15 de novembro no Rio de Janeiro. Foram seminários, encontros e debates diversos, mobilizando pessoas interessadas em sugerir políticas públicas para os líderes das 19 economias mais potentes do planeta mais a União Europeia e a União Africana.
Entre as discussões realizadas por mais de 1.300 organizações da sociedade civil, movimentos sociais, grupos de engajamento, organismos nacionais e internacionais, universidades, órgãos governamentais e técnicos, cerca de 40% das atividades abordaram a sustentabilidade, as mudanças climáticas e a transição energética justa; 39% trataram das formas de combate à fome e às desigualdades; e 20% debateram a governança global.
Neste âmbito, a mesa “Reforma da governança global: O Pacto Digital Global no contexto da Internet Livre” buscou promover um diálogo entre diferentes atores do ambiente digital para ampliar a reflexão sobre o Pacto Digital Global, propondo um olhar para as governanças digitais para além das big techs e visando explorar caminhos para uma internet mais livre, colaborativa e diversa. Firmado pelos países membros da ONU (Organização das Nações Unidas) em setembro deste ano durante a Cúpula do Futuro, o Pacto Digital Global estabeleceu um compromisso compartilhado entre os países signatários sobre o uso da tecnologia, e agora precisa ser operacionalizado localmente.
“Consideramos muito positivo que o texto do pacto tenha dado destaque aos múltiplos modelos de infraestrutura e bens públicos digitais, como softwares livres, padrões de dados abertos e de conteúdo aberto, apontados como principais indutores de uma transformação digital mais inclusiva. O desafio, agora, é implementar as recomendações e garantir que os compromissos se transformem em ações concretas”, destacou a gestora de Comunicação do WMB, Marília Rocha.
Durante a mesa de debates, ela apresentou a campanha do Movimento Wikimedia, assinada por dezenas de afiliados e outras organizações ao redor do mundo, que propunha a incorporação de três princípios no texto do Pacto Digital Global. Em parte graças a essa campanha e outras mobilizações, o texto final reconhece que os bens públicos digitais empoderam as sociedades para direcionar as tecnologias digitais à resolução de suas necessidades, e podem ampliar oportunidades sociais e econômicas para todas as pessoas. Considerando que é preciso ampliar investimentos no desenvolvimento dessas infraestruturas, os signatários do Pacto se comprometem a:
– Desenvolver, disseminar e manter, por meio de uma cooperação multissetorial, softwares seguros e livres, dados abertos, modelos de inteligência artificial abertos e padrões abertos que beneficiem a sociedade como um todo;
– Facilitar o uso de bens públicos digitais entre as diferentes plataformas e sistemas, adotando padrões abertos e interoperabilidade;
– Definir um conjunto de medidas protetivas para a implementação da infraestrutura pública digital segura, inclusiva, responsável e centrada nos usuários;
– Dar visibilidade às melhores práticas e casos de uso das infraestruturas públicas digitais, para informar governos, o setor privado e outros atores e ampliando repositórios;
– Estimular o estabelecimento de parcerias que conectem governos, o setor privado, a sociedade civil, as comunidades técnicas e acadêmicas e as organizações regionais e internacionais para criar, lançar e apoiar iniciativas que usem bens públicos digitais para alavancar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.
No total, o Pacto Digital Global tem 5 objetivos e mais de 60 compromissos, incluindo também a defesa de uma cooperação entre os diversos organismos para prevenir, identificar e solucionar os riscos de fragmentação da internet, promovendo um ambiente online que seja seguro, confiável, interoperável, global e aberto. Em defesa da integridade da informação e para combater a proliferação de discursos de ódio na internet, os signatários do pacto se comprometeram também a promover ecossistemas da informação diversos e resilientes, promover letramento midiático e informacional para todas as pessoas usuárias, além de convidar plataformas de redes sociais e companhias de tecnologias digitais a adotar medidas de transparência e responsabilização em seus sistemas, incluindo na moderação de conteúdo, uso de dados de usuários e de algoritmos.
“Precisamos caminhar para uma implementação bem-sucedida do pacto, e isso demanda uma reflexão coletiva sobre quais os caminhos mais efetivos para construirmos um futuro digital de fato mais seguro e aberto, em cada localidade. São questões relevantes para toda a sociedade, por isso não podemos ficar de fora desta construção”, reforçou Marília.
Participantes da mesa contribuem com recomendações
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Ao apresentar a importância da proteção de direitos de todas as pessoas no ambiente digital, a Coordenadora do Programa de Telecomunicações e Direitos Digitais no Idec (Instituto de Defesa de Consumidores), Camila Leite, abordou as conexões entre o Pacto Digital Global e as 20 recomendações do grupo de trabalho da sociedade civil, chamado C20. “Precisamos compreender qual a intersecção entre as discussões para lidar com tecnologia e buscar os pontos de convergência, mas sempre pensando que isso tem que ter uma participação equilibrada”, afirmou. “Para que essas discussões tenham legitimidade, não dá para ocorrerem só entre governos, é importante um fomento à participação da sociedade civil, considerando inclusive os seus desafios de acesso.”
O C20 (Civil20) foi oficializado como grupo de engajamento do G20 em 2013 e, desde então, é formado por organizações da sociedade civil que buscam discutir temas sociais, humanitários e de desenvolvimento sustentável. No dia 13 de novembro, o capítulo brasileiro do grupo entregou um Policy Pack, pacote de recomendações de políticas estratégicas com quatro temáticas prioritárias: (1) integridade da informação; (2) conectividade significativa à internet; (3) governo digital (e infraestruturas públicas digitais – DPIs); e (4) inteligência artificial (IA).
No tópico sobre integridade da informação, há destaque para ações de combate à desinformação, regulação de mercados digitais, responsabilidade e transparência por parte de plataformas digitais, entre outros. Sobre governo digital, viabilizar mecanismos de participação social e confiança institucional, capacitando as pessoas a buscar reparação quando seus direitos humanos não forem respeitados, ou os recursos públicos forem mal utilizados em infraestruturas públicas digitais (DPIs). No ponto sobre conectividade significativa à internet, o grupo aborda a importância de garantir acesso universal a dispositivos em prol da educação pública, estabelecer programas internacionais para abordar lacunas de infraestrutura e garantir acesso à conectividade para todas as pessoas.
Esse foi também um dos principais pontos da apresentação de Paulo Polinho, coordenador de dados no data_labe, laboratório que promove a democratização do conhecimento por meio de análise e divulgação de dados com foco em raça, gênero e território a partir do Complexo da Maré, no Rio de Janeiro. Ele lembrou que parte da população tem baixa conectividade significativa, ou seja, apesar de possuir algum tipo de conexão, não tem acesso a equipamentos adequados nem velocidade satisfatória, e reforçou que é preciso garantir os benefícios sociais, educacionais e econômicos de uma conectividade de alta qualidade para todos.
“A gente tem uma população que já está sendo deixada para trás e o Pacto Digital Global não menciona ela, nem expressa raça de forma efetiva. Se a gente tem políticas que não são pensadas de forma racializada, a gente vai aumentar as opressões”, destacou Paulo. “A gente precisa pensar, principalmente no aspecto local e regional, para realmente caminhar para um pacto mais equânime e mais justo, que chegue até os bairros e as periferias. O engajamento social pode ser um dos caminhos para corrigir esse sistema.”
Representando a área de educação da Agência Lupa, plataforma de combate à desinformação por meio do fact-checking e da educação midiática, o analista de educação Victor Terra Trouxe para a mesa uma série de iniciativas de formação e informação visando a integridade da informação, incluindo séries de educação midiática e o repositório acadêmico de divulgação cientifica da Lupa, o “Achado”.
“A gente busca acessar diferentes audiências por diferentes abordagens, considerando a importância de comunicar na perspectiva local, percebendo qual o tipo de conteúdo, formato, assunto que interessa para um diálogo efetivo com as pessoas, visando construir uma internet de fato mais íntegra, democrática e mais saudável”, destacou. “A mesa conseguiu contribuir bastante, porque a gente trouxe desde perspectivas mais técnicas até a aplicação desse tipo de reflexão na prática. A gente está trazendo as demandas sociais, ouvindo o cidadão que se interessa pelo assunto e podendo formular sugestões para que as lideranças dos países possam considerar essas perspectivas na tomada de decisão.”
Entre as pessoas que acompanharam o debate, a estudante e pesquisadora da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) Salete Martins destacou a importância de refletir sobre o papel das tecnologias na sociedade. “As tecnologias desempenham um papel fundamental e acabam interferindo no modo de vida, no trabalho, no cotidiano das pessoas e muitas vezes a forma como ela está colocada nem sempre está contribuindo de forma positiva. Não se trata de negar as tecnologias, mas pensar no ‘para que’, ‘para quem’ e ‘porque’ que elas estão sendo utilizadas desta forma”, refletiu. “Quero agradecer por esse momento maravilhoso que pudemos ter aqui, é muito importante oportunizar espaços de reflexão, para além do mero uso da tecnologia, para além do tecnicismo, problematizando a tecnologia a serviço dos interesses da população, numa perspectiva crítica e emancipatória da cultura digital.”
A ativista por direitos digitais e jovem líder da ONU para os ODS (Objetivos do Desenvolvimento Sustentável) Luiza Franco Machado completou: “Fiquei muito inspirada por essa mesa, conhecendo ações da sociedade civil para fazer com que esse tema de direitos digitais e governança de dados se inclua na realidade brasileira. Precisamos pensar como trazer mais pessoas para esse debate, que é tão essencial”, analisou. “Nossa responsabilidade é encorajar todo mudo a se envolver, a entender como o tema da governança digital implica nas nossas vidas privadas e públicas também. E incluir o olhar da juventude, a gente também tem que estar nesses espaços, demandando nossos direitos e fazer que isso seja um movimento nacional, regional e global também.”
WMB também apresenta fala em plenária de participação social
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No dia 15 de novembro, as pessoas participantes puderam escolher um dos três eixos de incidência do G20 Social Participativo, para sugerir modificações, inclusões ou comentários à versão final da declaração da Cúpula do G20 Social. O documento, aprovado e entregue à Presidência da República no dia 16 de novembro, reúne a síntese do que foi consenso entre os participantes de todo o processo participativo e foi considerado histórico na realização do G20, símbolo da participação cidadã na construção das políticas públicas.
O processo mobilizou votações se contribuições de forma online ao longo do ano e no encontro presencial durante a Cúpula. A partir do texto-base, as pessoas presentes puderam se inscrever para falas propositivas. O Wiki Movimento Brasil integrou o eixo de Reforma da Governança Global, defendendo a promoção de projetos de interesse público e das infraestruturas públicas digitais, como softwares livres, para ampliar as possibilidades de participação social efetiva.
“Nós devemos nos comprometer com a disseminação em escala de modelos de bens públicos digitais, que não apenas viabilizam o acesso livre ao conhecimento, como também são indutores de uma transformação social inclusiva, direcionando o desenvolvimento tecnológico para o bem comum”, afirmou a gestora de comunicação do WMB.
O coordenador geral de articulação da participação da Secretaria Nacional de Participação Social, Ronald Ferreira, destacou as contribuições de diferentes movimentos na construção em torno de ideias-forças sobre as questões centrais do atual contexto global. “Tivemos sensacionais contribuições sobre a necessidade de ter expresso na pauta da governança global a incorporação da democracia participativa e todos os instrumentos e ferramentas que possam ampliar a participação social, com ambientes livres e a questão do acesso à informação”, relatou. “Caminhamos no sentido de como possibilitar à sociedade participar de forma efetiva dos processos decisórios, transformando aquilo que é consenso dos diferentes setores da sociedade em capacidade política de interferir na realidade e mudar o curso das coisas.”
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