Editar, cuidar e resistir: tempo feminista e conhecimento livre

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Durante o mês de março de 2025, lançamos e realizamos a campanha “Tempo feminista: tempo para editar os projetos Wikimedia”, uma iniciativa que buscou visibilizar e reduzir a ampla desigualdade de gênero nos espaços de conhecimento livre.

Esta proposta foi desenvolvida de forma sustentada e ativa ao longo do mês, no marco do Dia Internacional das Mulheres Trabalhadoras, e esteve centrada em uma reflexão profunda e transformadora sobre o tempo: bem como recurso historicamente desigual, quanto em sua dimensão coletiva, política e libertadora.

A campanha convocou de maneira inclusiva mulheres e pessoas da diversidade sexual a participar ativamente na construção do conhecimento livre na Wikipédia e em outros projetos Wikimedia.

Por meio de diversas e enriquecedoras atividades em diferentes territórios, propôs-se questionar as profundas barreiras estruturais que afetam a distribuição do tempo e limitam a participação desses grupos na produção digital de conteúdos, promovendo uma mudança significativa em direção a uma representação mais justa e igualitária

Objetivos alcançados

Como encerramento desta edição do Tempo Feminista, podemos dizer que avançamos, mais um ano, em muitos dos objetivos propostos: visibilizamos as contribuições de mulheres e mulheres trans na Wikimedia e fortalecemos a participação de novas editoras com perspectiva de gênero.

Graças à colaboração coletiva, alcançamos resultados concretos que nos enchem de orgulho:

  • Foram criados 1.100 artigos e melhorados
  • 16.000 artigos na Wikipédia em espanhol e português.
  • Adicionadas 32.700 referências, fortalecendo a verificabilidade do conhecimento.
  • Liberadas 328 imagens no Wikimedia Commons, ampliando o acervo visual a partir de olhares feministas.
  • Melhorados 902 itens no Wikidata, contribuindo para a estrutura de dados livres com enfoque de gênero.
  • Realizadas mais de 42 atividades na América Latina e na Península Ibérica.

Um dos eixos centrais foi repensar o tempo como um recurso distribuído de forma desigual, o que condiciona a participação plena na construção do conhecimento livre. Como afirmou Ester Bonet, da Wikimulheres GU:”Falar de tempo é falar de poder e acesso. Muitas vezes damos como certo que qualquer pessoa pode editar a Wikipédia, mas a realidade é que as mulheres enfrentam limitações muito concretas: responsabilidades de cuidado, trabalho doméstico, falta de tempo para si mesmas.

Esta campanha trouxe visibilidade a essas desigualdades e nos fez valorizar ainda mais cada minuto que conseguimos dedicar à edição.” Essas reflexões foram parte fundamental do processo coletivo que impulsionou a campanha e nos convidam a continuar pensando em como tornar os projetos Wikimedia um espaço verdadeiramente acessível, equitativo e feminista. Olhares feministas em chave audiovisualNo âmbito da campanha, foi realizado um concurso audiovisual que convidou editoras a documentar lutas feministas em seus territórios.

As imagens selecionadas pelo júri se destacaram pela qualidade visual e pelo conteúdo testemunhal que carregam.

Primeiro lugar
Autora: Ale Raflo
Obra: Activistas en La Paz, Bolivia por el 8M (2024)

Autoría: Ale RaFlo | CC-BY-SA-4.0 – Obra: Activistas en La Paz, Bolivia por el 8M (2024)

Segundo lugar
Autora: Supa Lab
Obra: Día de Acción Global por el Aborto Libre – 28S – Lima, Perú

Terceiro lugar
Autora: Betttttttt
Obra: 8M – Montevideo 2025

Menção honrosa
Autoras: Colectiva Periódicas
Obra: Tiempo de lucha – Entrevista en marcha antifascista (Santa Fe, 2025)

O júri, composto por Paula Kindsvater (Argentina), Kelly Pariona Lagos (Perú) e Sara Aliaga Ticona (Bolívia), trouxe um olhar diverso, comprometido e profundamente conectado com os territórios e as narrativas feministas. A seleção valorizou não apenas a técnica, mas a capacidade dessas obras de emocionar, visibilizar e resistir.

Impacto e aprendizados

A campanha evidenciou mais uma vez as desigualdades que persistem nos projetos Wikimedia: as mulheres ainda são minoria nas biografias, e a representação é ainda menor quando se trata de mulheres negras, indígenas, trans ou outras dissidências. Nesse contexto, impulsionar o uso dos projetos Wikimedia torna-se fundamental para ampliar a participação e enriquecer o acervo coletivo com novas perspectivas, incluindo fotógrafas, artistas e ativistas. Essas ações reforçam nosso compromisso com a criação de conteúdos feministas e com o desafio de transformar as formas como se acessa e se constroi o conhecimento livre.

Sobre isso, Ester Bonet reflete:”O tempo para editar a Wikipédia não deveria ser um privilégio. Deveria ser um direito, uma possibilidade ao alcance de todas. Reconhecer os usos do tempo como uma questão feminista é essencial para reduzir as desigualdades de participação.”Temos o compromisso de seguir criando espaços inclusivos que nos permitam imaginar e construir realidades onde as mulheres possam participar plenamente.

O tempo que fazemos juntas

O tempo que compartilhamos foi um tempo profundamente feminista. O painel, organizado por APC, Ennegrecendo a Wikipédia, Wikimedia Argentina, Whose Knowledge?, Dominemos as TIC e Wikimedia Foundation, tornou-se um espaço valioso de reflexão, onde mulheres e pessoas LGBTQIA+ se reuniram para pensar coletivamente na construção da memória. Discutimos como preservar nossos registros, arquivos e lutas, e refletimos sobre como garantir que nossas histórias não fiquem sob o controle de grandes corporações ou sejam censuradas por governos autoritários.

Vozes de ativistas e especialistas lideraram o debate sobre a distribuição desigual do tempo e o empoderamento de mulheres e pessoas da diversidade sexual na criação de conhecimento digital, abrindo espaço para análise e ação transformadora. Nesse sentido, Mariana Fossati, da Whose Knowledge?, compartilhou uma reflexão crucial:”Um pilar super importante da nossa campanha Tempo Feminista foi o tempo para conversar, refletir e trocar ideias sobre por que fazemos isso. Sem um momento reflexivo, o tempo para editar a Wikipédia perde o sentido, seria apenas somar bytes.”Essa perspectiva permeou tudo o encontro e reforçou a urgência de pensar além das wikis: como construímos memória feminista nos territórios digitais que habitamos hoje?

Fossati alerta sobre a urgência desse trabalho:”O tempo para documentar e preservar nossas memórias é escasso e está ameaçado. Por isso, promovemos uma conversa mais ampla para sustentar o trabalho de cuidado da memória. Sem memória feminista, não podemos fazer Wikipédia.”

Nossa história compartilhada

Esta campanha faz parte de um processo contínuo e colaborativo que começou há mais de dez anos, com iniciativas como A Mulher que Você Nunca Conheceu, Mulheres com Rua, Alto! Mulheres Trabalhando e Alto! Mulheres Fazendo História. Desde então, mais de 20 organizações de 12 países da América Latina e da Península Ibérica uniram forças para visibilizar mulheres e pessoas LGBTQIA+ que foram excluídas dos relatos oficiais.

A campanha é realizada de forma bilíngue (em espanhol e português) e busca ampliar horizontes, recuperar histórias apagadas e empoderar aquelas que foram silenciadas historicamente.Se você quiser saber mais sobre os resultados de 2025, visite a página oficial: https://meta.wikimedia.org/wiki/Event:Tiempo_feminista_para_editar_Wikipedia/Resultados

Lá você encontrará informações detalhadas sobre as atividades realizadas, as conquistas alcançadas e as pessoas premiadas no concurso da Wikipédia e do Wikimedia Commons.


Traductora: Florencia Aguilar

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